Um fundador me procurou semana passada. Frustrado, mas não derrotado.
Seu projeto tinha sido rejeitado. Nada incomum no ecossistema de inovação brasileiro, certo?
Só que ele fez algo que poucos fazem: foi atrás dos projetos aprovados.
O que ele descobriu deveria estar em cada manual de empreendedorismo do país
Projeto aprovado #1: Vindo de uma consultoria conhecida no sistema. Metodologia vaga. Bibliografia de 2012. Orçamento sem justificativas técnicas.
Projeto aprovado #2: Indicação política (segundo múltiplas fontes). TRL declarado como 4, mas as evidências técnicas mostravam TRL 2. Equipe sem expertise comprovada na área.
Projeto rejeitado (o dele): Metodologia de 32 páginas. Estado da arte quantificado com 80+ referências atualizadas. TRL evidenciado com protótipos funcionais. Orçamento justificado item por item.
Motivo oficial da rejeição: "Metodologia insuficientemente detalhada".
A mesma metodologia que tinha mais rigor técnico que os dois projetos aprovados somados.
A verdade que o ecossistema não quer admitir
O sistema de fomento à inovação no Brasil funciona como um clube privado.
E clubes não operam por métricas publicadas. Operam por códigos internos.
Networking. Histórico de relacionamento. Alinhamento político. Presença nas "rodas certas".
O problema não é a competência técnica dos avaliadores. Muitos são excelentes profissionais.
O problema é o sistema que permite que critérios subjetivos se sobreponham sistematicamente a critérios técnicos.
Por que reclamar não resolve nada
Você pode:
- Escrever posts indignados no LinkedIn
- Reclamar em grupos de WhatsApp de empreendedores
- Mandar e-mails para ouvidorias que nunca respondem
Resultado? Zero.
Pior: você fortalece o clube. Porque enquanto você reclama, os "de dentro" continuam aprovando projetos entre si.
Existe uma estratégia que funciona (e não, não é desistir)
A única arma real que temos é tornar a injustiça visível e custosa.
Como?
Construindo propostas tão tecnicamente perfeitas que rejeitá-las exige pareceres frágeis, contraditórios e juridicamente questionáveis.
É sobre elevar o custo da arbitrariedade.
Quando sua proposta é irrefutável:
- O parecer negativo precisa inventar justificativas fracas
- Essas justificativas podem ser sistematicamente contestadas
- O recurso técnico se torna viável
- A exposição do viés se torna inevitável
O que isso significa na prática
1. Documentação blindada Não apenas "boa". Blindada. Estado da arte com dados quantitativos. Metodologia que antecipa cada pergunta. Cronograma que demonstra viabilidade.
2. Evidências irrefutáveis de TRL Fotos, vídeos, dados de testes, relatórios técnicos. Não declarações. Provas.
3. Orçamento milimétrico Cada item justificado. Cada valor comparado com referências de mercado. Zero margem para questionamento.
4. Estratégia de recurso preparada antes da submissão Você sabe que pode ser rejeitado injustamente. Prepare a contestação técnica antes mesmo de enviar.
O objetivo não é apenas ganhar uma chamada
É criar um custo reputacional para decisões arbitrárias.
Quando 10, 20, 50 projetos tecnicamente impecáveis são rejeitados com pareceres fracos, o sistema começa a ficar exposto.
Quando esses fundadores entram com recursos técnicos bem fundamentados, a fragilidade dos critérios fica documentada.
Quando casos assim chegam ao Ministério Público, TCU ou controladorias, o clube precisa se justificar publicamente.
Não é sobre ser melhor. É sobre ser inquestionável.
O fundador que me procurou está refazendo o projeto.
Não para ser "bom". Para ser tecnicamente irrefutável.
Ele entendeu: não está competindo por mérito técnico. Está competindo contra um sistema que prefere mediocridade conhecida a excelência desconhecida.
E a única forma de vencer é tornar a rejeição tão obviamente injusta que o custo de mantê-la seja maior que o custo de aprová-la.
Se você já foi rejeitado injustamente em chamadas de fomento, não está sozinho.
A questão não é se o sistema é justo. Não é.
A questão é: o que você vai fazer com essa informação?
Desistir fortalece o clube.
Reclamar não muda nada.
Mas construir propostas inquestionáveis e contestar tecnicamente pareceres frágeis? Isso cria mudança sistêmica.
Um caso de cada vez.
E você? Já passou por algo assim? Como lidou?
